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18
Fev21

Vidas (14)

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Continuação (14)

Começou com o ordenado de setenta escudos mensais, cama e roupa lavada, foi aumentado vinte escudos de cada vez, atingindo os cento e noventa escudos

Em 1958, ainda se viam algumas carroças pelas ruas. Ao cimo da Rua da Imprensa Nacional, do lado direito de quem sobe, havia uma olaria, que mais tarde foi transformada numa loja de artigos de plástico

Foi um ano de eleições Presidenciais, em que o General Humberto Delgado terá ganho as eleições. Questionado sobre o que faria a Salazar, se ganhasse, deu uma resposta, que deve ter ditado a sentença da sua morte: “obviamente demito-o”. (em 1965, foi morto pela PIDE)

Em 1957 tinham começado as emissões regulares da televisão. Muito poucas pessoas tinham televisão, José e o patrão, de vez em quando, depois do jantar, iam ver a televisão, a um café na rua de São Marçalo. A patroa ia para o andar, os filhos deitar

Assistiram à apresentação, pelo saudoso Artur Agostinho, do novo concurso da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, as Apostas Mutuas Desportivas: o Totobola

José teve sorte com o local para onde foi trabalhar: a paróquia de São Mamede, o local onde começaram os Estudos Politécnicos, daí o nome de rua da Escola Politécnica, o Jardim Botânico, a Imprensa Nacional. E, onde viviam figuras ilustres, como o cineasta Leitão de Barros, que vivia na rua do Arco a São Mamede, o distinto cirurgião Dr. Celestino da Costa, que morava numa rua perpendicular à rua da Imprensa Nacional, um quarteirão abaixo do Lugar de Frutas e Hortaliças, em frente ao estabelecimento vivia o conde de Arrochela, que segundo o motorista, gostava de viver a noite Lisboeta

Ao colega de escola, um ano mais tarde, coube-lhe, em sorte, uma taberna, na Avenida Infante Dom Henrique

Alguns operários da Imprensa Nacional, que trabalhavam por turnos, quando acabavam o turno da noite, iam “ matar o bicho”, e, nas noites em que eram visitados pela PIDE, informavam o José de quantos tinham ido presos. Tristes tempos, em que não se podia abrir a boca!

As ruas de Lisboa, desde manhã cedo, eram inundadas de pregões: a mulher da fava-rica, as varinas, os ardinas, no tempo dos figos, a mulher que apregoava:” quem quer figos, quem quer almoçar”, o homem do ferro-velho, cujo pregão era: “ quem tem jornais, trapos ou garrafas para vender”

No primeiro andar, do prédio do estabelecimento, vivia uma idosa, sozinha. De manhã o ardina dava um género de nó, num jornal matutino e atirava-o para a varanda, à tarde o ardina passava, e ela devolvia-lhe o jornal. Certamente, no dia seguinte entregava-o como não tendo sido vendido, o que era verdade, só o tinha alugado durante o dia. O José nunca soube quanto é que ela pagava pelo aluguer. Naquele tempo, também se editavam vespertinos, e por vezes, mais que uma edição, se algum acontecimento o justificasse, o que faziam com que os ardinas não se cansassem de apregoar: última hora”

Todos aqueles criados e criadas ansiavam, por o dia em que tivessem um espaço seu, alguém que os acarinhasse. Viver vinte e quatro horas, trezentos e sessenta e cinco dias, nas casas dos patrões, cansava! Sem dias de férias, nem de descanso, apenas algumas horas, por semana ou de quinze em quinze dias, como acontecia a algumas criadas, ao domingo, das 15 às 19 horas, para namorarem

Por vezes, criados e cridas falavam dos seus problemas, como eram trados pelos patrões, limpando as lágrimas uns aos outros, confortando-se com palavras de esperança em dias melhores. Eles, na esperança de que, depois da tropa, conseguissem ir para a Polícia, Carris, Metropolitano. Elas, na esperança de que um príncipe encantado as libertasse

Algumas nunca casaram, e na velhice, quem lhes valia era a casa de Santa Zita, Santa, sua padroeira. Algumas vendiam postais, à porta das Igrejas, para ajudarem a organização

No quarteirão, do Lugar de Frutas e Hortaliças, havia um Colégio Feminino, onde andavam duas filhas de uma Senhora, que morava no Largo de Camões. A senhora começou a fazer as compras onde o José trabalhava, mas exigia grandes descontos. O patrão, de sebenta na mão, ia tomado nota do que Senhora queria e dos preços que exigia

Feitas as contas, como dizem no Alentejo, não dava a mexa para o sebo. Então, teve a genial ideia de equilibrar os descontos com um erro no total da soma. Não havia máquina registadora, era tudo somado à mão. Começou por acrescentar dois escudos e cinquenta, três ou cinco escudos, conforme os descontos que ela exigia. Estava combinado que, se descobrisse, se tratava dum erro na soma. Pagava depois de receber as mercadorias, nunca somou a conta!

Como era muita coisa, o cabaz ficava muito pesado, o patrão dizia-lhe para ir duas vezes. Mas ele não achava jeito ir duas vezes, da Rua da Imprensa Nacional ao Largo de Camões. Por isso, pedia para lhe colocar o cabaz no ombro e lá ia, descansava, colocando o cabaz em cima dos marcos do correio. A primeira paragem era no jardim do Príncipe Real, a seguir no jardim de São Predo de Alcântara, a última, na casa da freguesa, depois de subir dois lances de escada

O país estava em ebulição. Depois, do que aconteceu nas eleições presidenciais, a invasão do Estado Português da Índia, pela União Indiana. Nesses anos realizaram-se algumas procissões noturnas, da Igreja de São Mamede ao Convento do Carmo, acompanhadas por carrinhas da Legião Portuguesa, com altifalantes, cheias de Legionários 

A seguir à invasão, do Estado Português da Índia, organizaram uma procissão para evocarem Afonso Albuquerque, ao chegarem ao Convento do Carmo, gritaram: “ Levanta-te, grande Almirante Afonso Albuquerque”!  

Continua

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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