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11
Fev21

Vidas (11)

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Continuação  (11)

Francisco, assim que pôde, foi a Santa Cruz. Disse ao patrão, do José, que era um mentiroso, que devia estar habituado a fazer dos pobres gato-sapato, mas que com ele se tinha enganado! Que tomasse conta dos porcos, porque o seu filho não era mais seu criado

José foi com o pai, para casa, por mais uns dias, não muitos, porque apareceu um Senhor que tinha duas vacas e dois bezerros, precisava dum rapaz para, os animais, guardar

Estava a fazer uma casa na Califórnia, um Monte situado na margem esquerda da Ribeira do Vascão. Não morava lá, uma vez que casa ainda estava em construção

José adorava aquele sítio, por estar junto à Ribeira, onde com outros rapazes se entretinham na brincadeira. As vacas e os seus filhos davam pouco trabalho

Nas horas de maior calor estavam presas, e ele ou ia para a Ribeira, ou montar armadilhas para apanhar perdizes. Não conseguiu apanhar nenhuma!

Foram meses maravilhosos, de liberdade e brincadeira. Os caseiros eram boas pessoas, queriam era que cumprissem com as obrigações, para que quando o patrão fosse lá, não ter nada a dizer

Depois de debulhado o trigo, foram dormir para a eira. As eiras, normalmente, situavam-se nos pontos altos, onde há mais vento, para limpar o trigo, que consistia em atirar ao ar, com uma pá de madeira, a palha e o trigo, como a palha é mais leve ia para mais longe, e assim se limpavam toneladas de trigo, durante a debulha

Adormeciam a ver as luzes dos carros, no ziguezague das curvas da Serra do Caldeirão, na estrada nacional, 2, com a lua a adormecer as estrelas e a liberdade de dormirem ao relento

José nem sabia que havia a tradição das chocalhadas! Os colegas, ao meio dia, do dia da chocalhada, informaram-no de que à noite iam fazer uma chocalhada, porque um casal tinha-se separado e voltado a juntar-se

Lá foram, com um ou dois chocalhos dos animais que andavam a guardar. Ainda caminharam um bom bocado até chegarem à casa onde vivia o casal, deram três ou quatro voltas à casa, fazendo uma barulheira infernal, com receio da reação dos visados, quando passavam na direção da porta, afastavam-se. Não houve reação, mas eles ficaram contentes por manterem a tradição

Uma notícia muito triste veio pôr fim àqueles meses de alegria. O irmão, mais novo do que ele, quatro anos, tinha caído da burra e fraturado o braço esquerdo. O pai levou-o para o Monte Mor-O-Novo, onde havia um famoso endireita. Mas, este disse-lhe que tinha de ir com o filho, para o Hospital. Foram para o Hospital de São José, onde o António ficou quase seis meses. Sujeito a várias operações, que não conseguiram fazer com que endireitasse e fechasse o braço, completamente

Francisco escreveu uma carta a uma prima da Alice, que vivia em Lisboa, pedindo-lhe se poderia ir visitar o filho, para que não se sentisse abandonado

Quando o António teve alta, ficando de voltar uns meses depois, para os médicos decidirem se lhe fariam nova operação, Francisco foi visitar a prima, agradeceu-lhe o apoio que tinha dado ao António, e aproveitou para lhe pedir se não arranjaria um emprego para o José, que já tinha feito a quarta classe

Ela disse-lhe que ficasse descansado, porque conhecia diversos donos de estabelecimentos, que estavam constantemente a admitir rapazes, para os ajudarem. Assim, que conseguisse arranjar alguma coisa, o contataria.

 

Continua

 

 

02
Fev21

Vidas (7)

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Continuação  (7)

O segundo ano letivo começou noutro Monte, noutro edifício, com outra professora, que lhes lecionou a segunda e quarta classes. O José ficou com mais tempo para ajudar os pais, nos trabalhos do campo. Tinha um balde de cinco litros, para ir regar as batatas, que o pai semeava junto ao ribeiro que ladeava a courela

João, ao contrário de outros pais, sempre disse que a Escola era o mais importante para os seus filhos, nunca tiraria os filhos da Escola para os ajustar aos latifundiários, para guardarem as bestas ou fazer quaisquer outros trabalhos, queria era que os seus filhos continuassem a estudar para além da quarta classe

Quando o filho ficou aprovado no exame da terceira classe, perguntou-lhe se gostava de ir para padre. José, que nunca o contrariava: ”disse-lhe que gostava”

De tempo a tempo repetia a mesma pergunta e a resposta era sempre a mesma. Decidiu contatar o Seminário para saber as condições de ingresso. Responderam-lhe que teria de pagar quatro mil escudos para o enxoval, o que fez com que essa hipótese não fosse viável. Mas, João nunca desistiu de procurar outras oportunidades para que os seus filhos pudessem continuar a estudar

A nova professora também estava determinada a fazer tudo o que pudesse, para que os seus alunos não ficassem atrás dos da professora oficial

Ao contrário da primeira professora, que nunca pediu aos alunos para lhe irem fazer as compras, pedia a dois alunos, de vez em quando, para irem, a São Pedro de Solis, comprar bacalhau e outros produtos. Pedia aos que moravam perto da Escola, uma vez que estes recados eram feitos depois das aulas, e os dos outros Montes ainda tinham de andar alguns quilómetros para chegarem a casa

Como nunca tinham comido bacalhau, de uma das vezes, o papel pardo, que o embrulhava, estava rasgado, aproveitaram para tirar uns bocadinhos, com muito cuidado, para que não se percebesse que tinha sido mexido, para provarem

Quando regressou das férias da Páscoa, a professora trouxe uma telefonia sem fios (TSF). Mostrou-a e ligou-a pouco antes das 13 horas, no intervalo para almoço, e disse que podiam ficar um pouco a ouvir. Estava sintonizado na Rádio Clube Português, que às 13 horas transmitia o programa dos Parodiantes de Lisboa, José fixou a piada de abertura e repetiu-a em casa, a mãe disse-lhe que se calasse, porque aquelas coisas não se diziam. Mas, o que o intrigava era de onde é que vinham aquelas vozes, se as pessoas não cabiam dentro da telefonia!

Mais tarde a professora explicou que as vozes eram transmitidas por ondas, que a antena do rádio captava. A explicação não os conseguiu convencer totalmente. Já era difícil acreditar, que por aqueles arames, presos às canecas de porcelana, que os homens andavam a esticar naqueles postos altos à beira das estradas, se pudesse falar, com outras pessoa, a que chamavam falar ao telefone, quanto mais uma caixa sem fios

Num dia de muita chuva, uma rapariga, que morava mesmo defronte da Escola, esteve toda atarde a namorar, quando entraram depois do intervalo do almoço, já eles estavam do lado de dentro da porta, mas com esta, toda aberta, para que quem passasse visse o que estavam a fazer. Quando não estava a chover, o rapaz ficava da banda de fora da porta

Quando estava quase a anoitecer, o rapaz saiu para avaliar o tempo, tinha deixado de chover, o Francisco acabava de chegar dos lados da ribeira do Vascão, que o rapaz tinha de atravessar para ir para casa, aproveitou para lhe perguntar se sabia como ia a ribeira. O Francisco disse-lhe para não se meter ao caminho, porque a ribeira leva um metro de água por cima das passadeiras

O rapaz mostrou-se preocupado, não podia dormir na casa da namorada. O Francisco ao aperceber-se da situação do rapar, disse-lhe para não se preocupar, jantava em casa dele, e tinha um palheiro onde ficar. Assim foi, no outro dia o rapaz meteu-se ao caminho

Já naquele tempo os jovens não queriam ficar nas suas terras, por não terem futuro. As raparigas estavam ali “presas” à espera que aparecesse um príncipe que as desencantasse e levasse para Lisboa, para França, Luxemburgo, Suíça, o que acontecia, quando saíam da tropa.

 

Continua

 

 

 

 

 

 

    

 

 

 

 

  

  

 

 

   

 

 

   

  

 

    

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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