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05
Fev21

Vidas (9)

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Continuação (9) 

Finalmente chegou o dia de irem para Mértola, para fazerem o exame da quarta classe. Um dia muito desejado, mas ao mesmo tempo, muito receado, porque era o fim de uma longa caminhada 

Mértola, a eterna princesa do Guadiana, esperava pelos jovens de todo o Concelho, que queriam participar na grande festa de conseguirem terminar os quatro anos de escolaridade obrigatória com a obtenção de um diploma

O Guadiana, estrada por muitos povos utilizada, porto de exportação dos cereais e minério, entrada de mercadorias vindas do mediterrâneo, que seguiam rio acima até Mértola

Mértola, um presépio debruçado sobre o rio, com o seu árabe casario, transformada num enorme Museu, a céu aberto

Uma semana ou mais para fazer o exame da quarta classe! Ao José, acompanhou-o a mãe, ficando o Francisco com os outros dois filhos, de 3 e 6 anos, um grande esforço para a família

Não tinham dinheiro para pagarem uma pensão, valeu-lhe a bondade dum militar, reformado, da Guarda Nacional Republicana, que lhes cedeu uma casa que não estava a ser habitada

Faziam as necessidades para um balde, para ser despejado, por um funcionário da Câmara Municipal de Mértola, numa carroça, que tinha aspeto de ser feita de zinco

Ainda estávamos longe das redes de esgotos e estações de tratamento de resíduos

Estavam a começar as fundações da ponte que une as duas margens do Guadiana, em Mértola

A professora, que residia perto do Castelo, todos os dias se reunia com os seus três alunos, na esplanada dum café, perto da Praça, dando-lhes os últimos conselhos para o exame

No início da semana fizeram a prova escrita, depois tiveram de esperar uns dias pela prova oral

José passava os tempos livres na Praça, de onde há uma vista panorâmica sobre o rio. Encantava-o o baloiçar do barco que fazia a carreira entre Mértola e Vila Real de Santo António

Do outro lado do rio havia uma grande moagem, servida por uma barcaça, que andava todo o dia de um lado para outro, levando trigo para a moagem e transportando farinha para a outra margem

José e o colega combinaram tentar ir ver a moagem. Um dia, já ao fim da tarde, aproximaram-se da barcaça atracada, pediram ao Senhor que a manobrava, se os podia levar, porque gostavam de ver como funcionava a moagem. O senhor disse que sim, mas disse-lhes que só voltava à noitinha, quando acabava o trabalho. Disseram que estava bem e agradeceram-lhes por os levar

As mães, vendo que não regressavam a casa, percorreram toda a Vila, à sua procura, e nada! Desesperadas, encaminharam-se para o rio, ao verem-nos, os seus corações respiraram de alívio

Deram-lhes um grande raspanete, mas abraçaram-nos como se tivessem passado anos sem os verem. Mãe, muito sofre!

Finalmente chegou o dia da prova oral, já estavam saturados da Vila, queriam acabar com aquela espera, saber se ficavam aprovados, pôr fim aquela ansiedade, voltar para as suas casas

José foi o primeiro a ser chamado ao quadro, os professores ainda estavam a pôr a conversa em dia, não chegava ao quadro, mas não dizia nada, estava à espera que os professores olhassem para ele, até que um professor olhou e disse: “ não chegas ao quadro? Já pomos aí um banco”

Depois, enquanto esperavam pelos resultados, as mães tentavam acalmares-lhes a ansiedade. A grande moda eram as meias de vidro. Era grande o contraste entre as mulheres do campo e as da Vila, umas de meias de linha e outras de perna à vista, um grande avanço devido à segunda guerra mundial

Assim que os resultados foram afixados e fechados na vitrina, todos a rodearam para confirmarem se à frente do nome estava a palavra apurado. Foi uma alegria imensa! As mães estavam tão orgulhosas dos seus frutos

No outro dia, quando regressaram a casa, Francisco felicitou o filho. A mãe estava tão contente, que queria era dar-lhe um presente, uma recordação

Tirou duma prateleira um tinteiro vazio, um frasco quadrado, de vidro, com um gargalo redondo, e deu-lhe como prémio por ter ficado aprovado

Foi a melhor prenda que lhe deram, por ter sido dada com tanto carinho. A mãe estava triste por não ter mais nada para lhe dar, mas ele agradeceu-lhe e disse-lhe que era lindo. 

Continua

 

 

 

 

 

 

 

  

   

    

 

 

 

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