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cheia

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27
Jan21

Vidas! (3)

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Continuação    (3)

 

No ano em que o filho mais velho fez seis anos, num Monte a dois quilómetros, começou a funcionar um posto escolar

Um casal cedeu uma casa, onde funcionava a Escola e vivia a professora

O equipamento da sala de aula eram meia dúzia de cadeiras e uma mesa

Estávamos em outubro de 1951

Só a quarta professora, das que visitaram o local, aceitou trabalhar naquelas condições! 

Eram conhecidas por professoras regentes, só tinham a quarta classe e um pequeno estágio

O País estava envergonhado por ter quase cem por cento de analfabetos

Com o fim da segunda guerra mundial, o mundo deu um salto tecnológico, Portugal foi confrontado e muito criticado por ter tantos analfabetos

Era preciso criar postos escolares, mesmo em casas particulares, como a que funcionava na casa onde ele nasceu

Estas professoras não podiam casar sem a autorização do Ministro da educação

Dedicavam-se muito à sua profissão

Queriam que os seus alunos, quando fossem, às Escolas das professoras oficiais, fazer as passagens da primeira para a segunda ou da segunda pra a terceira classes, brilhassem, querendo o mesmo nos exames da terceira para a quarta classe e no exame da quarta classe, que constava de duas partes: primeiro a prova escrita, mais tarde a prova oral, normalmente, tinham lugar na sede de Concelho

A primeira professora, do José, era uma rapariga muito determinada. Quando aceitou criar aquela Escola, fê-lo com o propósito de tudo fazer para que os pais compreendessem, o quanto era importante mandarem os filhos à Escola

Não foi fácil, estavam habituados a contar com o seu trabalho para a casa, ou ajustavam-nos para trabalharem para os grandes latifundiários

Passado um mês do início das aulas, vendo que não aparecia mais ninguém, não chegavam a uma dezena, uma manhã, decidiu ir com eles a um Monte, não muito longe

Lá foi ela, com os alunos atrás, parecia uma galinha com os pintos. No caminho, encontrou um homem com o filho a trabalharem na horta

Depois de os cumprimentar, perguntou ao homem se não sabia que era obrigatório mandar o filho à Escola, e ele respondeu: “se lhe der de comer”

Seguiram o seu caminho, para o Monte, onde, junto das mulheres tentou fazer-lhes compreender quanto era importante mandarem os filhos à Escola

 

Uma manhã, pouco depois do José sair para a Escola, um homem bateu à porta, perguntou se era a Alice, entregou-lhe uma carta, dizendo que o marido lhe tinha pedido para lhe entregar a carta, e que ele estava bem.

Alice virou e revirou a carta, tinha três selos de lacre no verso, com o formato e a face duma moeda, para que ninguém a abrisse, era muito usual, quase sempre, por exigência do portador

Abriu o envelope, retirou a carta e duas notas, uma de vinte e outra de cinquenta escudos, concentrou-se na carta, sentiu uma grande tristeza por não saber ler, depois alegrou-se por o filho já conseguir ler, não precisava de ir pelo Monte, perguntar quem é que sabia ler, expor a terceiros as palavras intimas, que com certeza o marido lhes tinha dedicado, a ela e aos filhos

Admirou a letra, desenhada, do Francisco, tão bonita! E ela sem saber o que dizia, pensou no que teria passado até arranjar trabalho

Por um lado, gostava que o homem tivesse chegado ao mesmo tempo do José, para ele lhe ler a carta e saber, imediatamente, o que estava ali escrito

Por outro lado, estava tão feliz por ter passado o dia a mexer naquele papel, que o Francisco tinha escrito, tinha o cheiro dele, apertou-o ao peito, sentiu as suas impressões digitais

Quando o filho chegou, correu para ele, beijou-o e disse-lhe que o pai tinha mandado uma carta, por um homem que tinha estado a trabalhar com ele, que lhe bateu à porta, mal ele tinha saído

Pediu-lhe se a conseguia ler, porque estava tão ansiosa por saber o que dizia.  José ainda soletrava as letras, mas conseguiu lê-la, toda. Dizia que esperava estivessem todos bem.

 Encontrara durante os muitos dias que levou a percorrer quase todo o Distrito, pessoas que lhe deram de comer e arranjaram onde dormir. Em cada Monte, ia pergunta se sabiam de alguém que precisasse de um trabalhador.

Quando se aproximava a noite, as pessoas perguntavam-lhe onde é que ia dormir, e ele aproveitava para lhes pedir se não tinham um palheiro onde pudesse ficar. Não só lhe arranjavam onde dormir, como acabavam por lhe dar a ceia. No dia seguinte continuava a sua caminhada, alguns, ainda lhe davam um bocado de pão e umas azeitonas, para comer pelo caminho, até encontrar nova povoação.

Ao chegar perto de Beja, encontrou um Senhor que tinha um olival para limpar. Assim que acabasse o trabalho, que faria em poucos dias, voltaria, porque queria ajustar uma empreitada para a ceifa, como fazia todos os anos.

Assim que acabou de ler a carta, a mãe mostro-lhe as duas notas, pedindo-lhe que levasse a nota de cinquenta escudos, que fosse, com a burra, comprar uma arroba de farinha de trigo, ao moinho do Pizão, que ficava na margem esquerda da ribeira do Vascão. 

Disse-lhe para não se demorar, porque ainda queria peneirar a farinha, para no dia seguinte cozer pão, que há tanto tempo, por todos era desejado

O José montou-se na burra e dirigiu-se ao moinho, que ficava a uns três quilómetros. O moleiro era um senhor já de idade. Pesou a farinha, colocou o saco em cima da burra e avisou-o de que o saco podia cair, porque não o podia amarrar, sem uma albarda.

Continua  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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