A sedutora
Lisboa! A sedutora
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A mensalidade para pagar os estudos era pouco menos do que o que ganhava valeram-lhe as horas extraordinárias, para comprar os livros e restantes despesas
Voltava a ter de fazer muitos sacrifícios para continuar os estudos: oito horas de trabalho por dia, seis dias por semana, mais quatro horas por dia de estudos, só ficou com o domingo para fazer as horas extraordinárias
Num domingo de agosto, enquanto todos foram para a praia, ficou sozinho, naquele primeiro andar, fez quatro tapetes, ganhou 60 escudos, ficou muito contente
Nem todos os tapetes eram iguais, havia uns que tinham menos trabalho que outros, eram todos pagos a 15 escudos
Estava preocupado com o custo dos livros. Mas como eram livros únicos e não mudavam todos os anos, mantinham-se por vários anos, podiam-se comprar em segunda mão
Quando se matriculou deram-lhe a lista dos livros necessários para frequentar o primeiro ciclo liceal
Em conversa com um colega, ficou a saber que, na Calçada do Carmo, em Lisboa, defronte do Quartel do Carmo, havia um alfarrabista que comprava e vendia livros escolares em segunda mão, aproveitou para comprar também um dicionário de português, em segunda mão ( da Porto Editora, 3ª edição)
Com um horário escolar das 20 às 24 e mais oito horas de trabalho, metade do dia ocupado a trabalhar e estudar, foi assim durante quatro anos, até ser chamado para cumprir o serviço militar obrigatório
No primeiro dia de aulas, o professor de português mandou-os fazer uma redação, para avaliar o que cada um sabia, quando lhe devolveu a redação, disse-lhe que tinha gostado das rimas e que continuasse
O professor de ciências naturais, com a alcunha de “paramécias”, tinha o programa memorizado, e como os alunos não tinham tempo para estudarem, ditava-o de memória, obrigando os alunos a escreverem com rapidez ou a substituírem algumas palavras por sinais
Quando o interrompiam tinha de estar como que a rebobinar a cacete para encontrar onde ia
Depois do 25 de Abril de 1974, apareceu na televisão a explicar como distinguir o bacalhau do pixilin, porque alguns comerciantes estavam a enganar os clientes
O patrão abriu a primeira loja, na Rua de São Bento, em sociedade com um merceeiro, que tinha visto o negócio reduzir muito. Mas a sociedade foi de curta duração
Andava sempre com problemas de dinheiro, as letras a 90 dias, venciam-se antes da venda dos tapetes ou do recebimento das vendas destes
Mas, isso não o impediu de comprar o trespasse de uma loja de móveis, na rua dos Poiais de São Bento, onde passou a vender, também, tapetes
No dia do vencimento das letras é que se via o sofrimento por que passava, tinha o hábito de enquanto fazia a barba, deixar a porta da casa de banho aberta, falava para o espelho, arrepelava os cabelos, quem não soubesse diria que tinha enlouquecido, o que não podia era deixar que fossem para protesto, porque isso podia fazer com que não pudesse comprar a crédito
Numa manhã, o empregado viu muito aflito, esqueceu-se de que o irmão se queixava de nunca mais ter visto as suas poupanças, disse-lhe que tinha 4.000 escudos nos CTT ( os CTT tinham uma parceria com a Caixa Geral de Depósitos, que permitia que se depositasse e levantasse dinheiro nos CTT, como se fossem agências da Caixa)
Passou o tempo, pediu-lhe o dinheiro várias vezes, mas não conseguia que ele lhe pagasse os 4.000 escudos, que lhe tinha emprestado.
Continua