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20
Jul23

O Império

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O Império  -  As  teias que o Império teceu

18

 

As naus da armada, que já há longos meses tinham zarpado de Lisboa, continuavam a enfrentar grandes tempestades

Depois de terem tido de aportar no Funchal, na Ilha da Madeira, quando se fizeram, de novo ao mar, foram novamente fustigados por mais e maiores tempestades

Devido à destruição de velas e mastros tiveram de atracar, também, no porto de Angra do Heroísmo, na Ilha Terceira, nos Açores

A Miquelina estava surpreendida com tantas e tão violentas tempestades, esta viagem não tinha nada a ver com a sua primeira viagem

O Ezequiel e a Miquelina voltaram a encontrar-se em terra, antes de dizer qual era a sua decisão, a propósito do convite, para ficarem os dois em Luanda, questionou-o sobre que planos é que tinha, para viverem em Angola

Ficou um pouco atrapalhado, mas não teve outro remédio senão dizer que não tinha nenhum plano, contava com a ajuda do irmão

Respondeu-lhe que isso não a tranquilizava, e se não o encontrassem, o que fariam

Tentou convencê-la de que não seria muito difícil encontra-lo, porque a cidade não deveria ser muito grande, era uma cidade jovem, ainda em formação, onde dois jovens como eles, não triam problemas para sobreviverem

Mas, ela não estava nada convencida das facilidades, pelo contrário, achava que poderiam não  o conseguir encontrar, porque Angola era muito grande, e ele poderia não ter ficado na cidade

Tentou pôr fim a tantas dúvidas, disse-lhe que o melhor era não sofrerem por antecipação, quando lá chegassem veriam o que fazer, queria era saber qual era a decisão dela

Começou por lhe dizer que nem ela sabia o que fazer, mas que estava muito cansada daquela viagem, tão diferente da outra, sempre rodeada de tempestades, não lhes dando folga, nem para respirarem

Vendo que ele estava ansioso, quase a explodir, disse-lhe que gostava muito dele, estava disposta a ir com ele, para o bem e para o mal, para todo o lado

Ezequiel estava radiante, não resistiu, beijou-a e abraçou-a, ela, também, ficou felicíssima

Quando chegassem a Lunada, iam começar uma nova vida, noutro continente, de uma luminosidade atraente, quente, em estado selvagem, onde viajar é uma aventura continua

Beijaram-se mais umas quantas vezes, como se estivessem a despedir, para uma separação de meses ou anos, iam voltar ao navio, mas tinham de continuar indiferentes, fingindo não estarem apaixonados, eram, apenas, colegas de trabalho, como única mulher a bordo tinha de a todos tratar por igual, para que por todos fosse respeitada

Tinham de continuar a desempenhar os seus papéis, para que ninguém desconfiasse, até que a armada, a Angola, chegasse

Dali em diante os papéis eram mais difíceis de desempenhar, tinham de desviar os olhares, para que ninguém desconfiasse

O Capitão já andava de olho neles, por vezes referia-se a eles, dizendo que era o casalinho, e isso não deixava a Miquelina, nada tranquila

Sabia que não tinha cometido nenhum erro, mas o facto de trabalharem os dois, dava azo a essas piadas, temia que o Ezequiel se esquecesse das regras e deitasse tudo a perder.

 

Continua

 

 

 

08
Jun23

O Império

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O Império – As teias que o Império teceu

12

O Januário e a sua Rosinha continuavam muito felizes, por em breve terem nos seus braços o seu primeiro rebento, toda família partilhava dessa imensa felicidade

O Soba, depois de o conhecer melhor o Januário, pediu-lhe para o ajudar nas contas com o negócio dos escravos, nos quais também estava envolvido

Luanda teve um papel importante nos negócios da escravatura, por ser uma das mais importantes feitorias portuguesas na costa africana, fazendo com que fosse um centro de formulação e execução de operações militares contra reinos africanos

Foi, também, uma base de intensa diplomacia entre africanos e europeus

Os escravos podiam vir de prisioneiros de guerra, comprados por traficantes, ou por meio de emboscadas

Os escravos eram levados a pé até aos portos, onde eram revendidos aos europeus, a troco de mercadorias importantes como: tabaco, cachaça, pólvora

 Eram marcados a ferro quente para se saber a que comerciante pertenciam

Os barcos que os transportavam eram conhecidos por tumbeiros, por muitos morrerem na viagem

Três anos depois de o Januário ter deixado Lisboa, nasceu a primeira filha da Rosinha e do Januário, chamaram-lhe Leopoldina, toda a família ficou muito feliz com a chegada de mais um membro para a família, que vinha ganhando notoriedade desde que o Januário se tinha associado ao Soba, no negócio da escravatura

A armada, que tinha permitido ao Januário a grande aventura de ter ido ao Oriente, já tinha atracado em Lisboa, depois de terem descansado três meses em Angra do Heroísmo, Nos Açores

Foram recebidos em festa, toda a cidade acorreu ao cais, para aplaudirem os valentes homens, que tinham ido tão longe e passado tanto tempo no mar

Mal sabia a multidão que uma mulher, também tinha participado, sem que ninguém tivesse descoberto que era mulher

O irmão do Januário, o Ezequiel, mais novo dois anos, que tinha ficado em Lisboa, porque tinha de tomar conta da mãe deles, que entretanto morrera, também estava entre a multidão, junto à saída do barco, onde o irmão tinha embarcado

Já tinham saído quase todos, e o irmão não aparecia, resolveu perguntar, a um grupo que acabara de abandonar o barco, se conheciam o Januário, e se sabiam alguma coisa dele

Disseram-lhe que tinha ficado em Luanda, nada que o irmão não temesse, uma vez que, na despedida, lhe tinha dito que queria tentar a sua sorte numa Colónia

Como não tinha mais nenhum familiar, pensou em ir ter com o irmão, mas para isso tinha de tentar fazer como ele tinha feito.

Continua

 

 

13
Abr23

O Império

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O Império – As teias que o Império teceu

4

Januário, um jovem de 20 anos, há muito que sonhava embarcar na carreira das Índias, um belo dia, ao ver que estavam a preparar mais uma partida, ofereceu-se para fazer parte da tripulação, foi aceite e ficou muito feliz

Queria conhecer novas terras, novas gentes, fazer fortuna, arranjar uma companheira, deixar a vida boémia de Lisboa

Chegou o dia de deixarem Lisboa e fazerem-se ao mar, estava radiante, finalmente podia fazer muitos projetos: ficar na Índia, em Luanda, em Lourenço Marques, onde aportassem e visse que era o melhor lugar para viver, não queria era voltar a Lisboa, não queria mais aquela vida de expedientes, sem futuro

Tinha planeado estar muito atento a todos os locais onde aportassem, para poder escolher onde ficar

A primeira paragem foi na Ilha Terceira, em Angra do Heroísmo, local que estava fora dos seus planos, queria uma colónia grande e rica, que fosse muito maior que a metrópole 

Seguiu-se Luanda, que o encantou, no pouco tempo que teve para ir a terra, tentou gizar um plano, para no regresso ficar em Luanda  

Seguiram para Índia, pelo canal de Moçambique, mas não aportaram, queriam chegar à Índia quanto antes, porque o seu destino era chegarem ao Japão, passando pelas Molucas

 Estávamos em 1629, não podiam perder tempo, ainda tinham de aportar em Goa, Malaca, Macau e Nagasaki

Januário teve a oportunidade de percorrer toda a carreira da Índia, teve muito por onde escolher, para se estabelecer e tentar enriquecer

Conheceu tantas e variadas gentes, que não sabia o que fazer, se bem que já se tivesse encantado por Luanda

Ainda esteve indeciso entre a Ilha de Moçambique e Luanda. Mas, acabou por preferir não perder, o Oceano Atlântico, de vista

Gostou muito da baia de Luanda, parecia um sítio ótimo para abandonar o barco e tentar constituir uma família, não faltariam bonitas raparigas nativas e bons terrenos para produzirem alimentos.  

Continua

 

 

06
Abr23

O Império

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O Império – As teias que o Império teceu

 

3

Já vem de muito longe, quem queira viver do trabalho dos outros, os cucos, que põem os ovos nos ninhos dos outros pássaros, para que lhes criem os filhos, porque criar filhos dá muito trabalho

Os piratas, que trabalhavam por conta própria, não tinham de prestar vassalagem aos Reis

Os corsários, que tinham um estatuto, estavam autorizados a roubar os barcos das nações em guerra com a sua, tinham a bênção dos Reis

As caravelas portuguesas tinham de evitar maus encontros com todos estes senhores, que não querendo ou não podendo ir ao supermercado das índias, queriam ficar com as especiarias e as sedas, que os outros tinham tido o trabalho de ir buscar

Por causa dos piratas e corsários, os Felipes, aquando da união Ibérica (1580 a 1640) mandaram construir em Angra do Heroísmo uma enorme muralha para proteger as mercadorias que vinham do Oriente e das Américas

Há quem diga que em Angra do Heroísmo foi criada a primeira estação de serviço: abastecimento e reparação de navios, angariação de homens para fortalecerem ou substituírem as tripulações, serviços para tratamento dos que chegavam doentes, hospedarias, tabernas, casas de meninas ………..    

Terá a Ilha Terceira inspirado Camões, para escrever a Ilha dos Amores?  

     …]aconselhara a mestra experta:
Que andassem pelos campos espalhadas;
Que, vista dos barões a presa incerta,
Se fizessem primeiro desejadas.
Alguas, que na forma descoberta
Do belo corpo estavam confiadas,
Posta a artificiosa formosura,
Nuas lavar se deixam na água pura.
 (Canto IX, 65)

Fonte: https://www.passeiweb.com/os_lusiadas_a_ilha_dos_amores/

 

Oh, que famintos beijos na floresta,
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã e na sesta,
Que Vénus com prazeres inflamava,
Milhor é exprimentá-lo que julgá-lo;
Mas julgue-o quem não pode exprimentá-lo.
 (Canto IX, 83)

Fonte: https://www.passeiweb.com/os_lusiadas_a_ilha_dos_amores/

 

“Ali, com mil refrescos e manjares, Com vinhos odoríferos e rosas, Em cristalinos paços singulares, Fermosos leitos, e elas mais fermosas; Enfim, com mil deleites não vulgares, Os esperem as Ninfas amorosas, D’ amor feridas, pera lhe entregarem Quanto delas os olhos cobiçarem.

Fonte: https://www.passeiweb.com/os_lusiadas_a_ilha_dos_amores/

 

Continua

 

30
Mar23

O Império

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O Império – As teias que o Império teceu

2

Os descobrimentos portugueses foram um grande empreendimento, não foi menor o sofrimento, lutar no oceano contra o vento, o imprevisto, o desconhecido, tudo foi tão sofrido

Não foram só os elementos naturais, que tiveram de enfrentar, também a alimentação foi uma grande preocupação: falta de alimentos, alimentos estragados, água cheia de bichos, um inferno, de muitos, desconhecido

Nem com a primeira estação de serviço, na Ilha Terceira, em Angra do Heroísmo, os problemas foram resolvidos, seriam precisas muitas mais estações de serviço entre Lisboa e Nagasaki

Contra ventos e marés, os portugueses nunca viraram a cara ao perigo, e com arte e engenho lá foram criando fortalezas, feitorias, erguendo padrões, tudo para conseguirem controlar o comércio da seda e das especiarias da Índia

Oh imenso mar, se pudesses falar, muito poderias dizer, sobre a bravura dos portugueses!

Tanta gente que morreu, de um país tão pequeno, para saberem o que havia para além de ti

Criaram um Império, que ia de onde o sol nasce até ao pôr, e também o meio-dia o via

Para ficarmos famosos, para nos livramos” da lei da morte” tudo fazemos, de todos os sacrifícios somos capazes, querermos ser famosos, faz-nos ser audazes

Vasco da Gama ficou famoso por ter conseguido ir à Índia, mas fala-se menos dos custos, de quantas vidas foram perdidas, de quantos filhos ficaram órfãos, de quantas mães perderam os filhos, de quantas noivas ficaram por casar, de quantas mulheres ficaram sem marido

No regresso da sua primeira viagem, o seu irmão, Paulo da Gama, adoeceu, diz-se com o mal de Luanda, (o escorbuto) outra designação, porque tanto as naus que saíam de Lisboa, em direção à Índia, como as que saíam da Índia em direção a Lisboa, antes de chegarem a Luanda, já todos os alimentos frescos tinham acabado, quase tudo já estava estragado, e a doença aparecia

O irmão tentou salvá-lo, ordenou que se dirigissem para a Ilha Terceira, para Angra do Heroísmo, sendo que a uma das naus foi dada ordem de que seguisse para Lisboa, para darem a boa nova ao Rei

Não resistiu, chegou morto ou muito doente, ficou sepultado na Ilha Terceira, em Angra do Heroísmo, no meio do Atlântico, foi o preço pago por ter tido a oportunidade de participar na primeira viagem à índia

Os anónimos, os que não têm nome, aqueles que ninguém sabe quem são não tiveram tanta sorte, não tiveram sepulturas eternas, foram atirados ao mar.

 

Continua

 

 

 

 

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