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cheia

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09
Fev23

A sedutora

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Lisboa! A sedutora

16

A mensalidade para pagar os estudos era pouco menos do que o que ganhava valeram-lhe as horas extraordinárias, para comprar os livros e restantes despesas

Voltava a ter de fazer muitos sacrifícios para continuar os estudos: oito horas de trabalho por dia, seis dias por semana, mais quatro horas por dia de estudos, só ficou com o domingo para fazer as horas extraordinárias

Num domingo de agosto, enquanto todos foram para a praia, ficou sozinho, naquele primeiro andar, fez quatro tapetes, ganhou 60 escudos, ficou muito contente

Nem todos os tapetes eram iguais, havia uns que tinham menos trabalho que outros, eram todos pagos a 15 escudos

Estava preocupado com o custo dos livros. Mas como eram livros únicos e não mudavam todos os anos, mantinham-se por vários anos, podiam-se comprar em segunda mão

Quando se matriculou deram-lhe a lista dos livros necessários para frequentar o primeiro ciclo liceal

Em conversa com um colega, ficou a saber que, na Calçada do Carmo, em Lisboa, defronte do Quartel do Carmo, havia um alfarrabista que comprava e vendia livros escolares em segunda mão, aproveitou para comprar também um dicionário de português, em segunda mão ( da Porto Editora, 3ª edição)

Com um horário escolar das 20 às 24 e mais oito horas de trabalho, metade do dia ocupado a trabalhar e estudar, foi assim durante quatro anos, até ser chamado para cumprir o serviço militar obrigatório

No primeiro dia de aulas, o professor de português mandou-os fazer uma redação, para avaliar o que cada um sabia, quando lhe devolveu a redação, disse-lhe que tinha gostado das rimas e que continuasse

O professor de ciências naturais, com a alcunha de “paramécias”, tinha o programa memorizado, e como os alunos não tinham tempo para estudarem, ditava-o de memória, obrigando os alunos a escreverem com rapidez ou a substituírem algumas palavras por sinais

Quando o interrompiam tinha de estar como que a rebobinar a cacete para encontrar onde ia

Depois do 25 de Abril de 1974, apareceu na televisão a explicar como distinguir o bacalhau do pixilin, porque alguns comerciantes estavam a enganar os clientes

O patrão abriu a primeira loja, na Rua de São Bento, em sociedade com um merceeiro, que tinha visto o negócio reduzir muito. Mas a sociedade foi de curta duração

Andava sempre com problemas de dinheiro, as letras a 90 dias, venciam-se antes da venda dos tapetes ou do recebimento das vendas destes

Mas, isso não o impediu de comprar o trespasse de uma loja de móveis, na rua dos Poiais de São Bento, onde passou a vender, também, tapetes  

No dia do vencimento das letras é que se via o sofrimento por que passava, tinha o hábito de enquanto fazia a barba, deixar a porta da casa de banho aberta, falava para o espelho, arrepelava os cabelos, quem não soubesse diria que tinha enlouquecido, o que não podia era deixar que fossem para protesto, porque isso podia fazer com que não pudesse comprar a crédito

Numa manhã, o empregado viu muito aflito, esqueceu-se de que o irmão se queixava de  nunca mais ter visto as suas poupanças, disse-lhe que tinha 4.000 escudos nos CTT ( os CTT tinham uma parceria com a Caixa Geral de Depósitos, que permitia que se depositasse e levantasse dinheiro nos CTT, como se fossem  agências da Caixa)

Passou o tempo, pediu-lhe o dinheiro várias vezes, mas não conseguia que ele lhe pagasse os 4.000 escudos, que lhe tinha emprestado.

 

Continua

 

 

04
Mar21

Vidas (18)

cheia

Vidas (18)

 

Continuação

 

 

  Mas, neste caso, o príncipe exagerou, dizendo que tinha mundos e fundos, e a princesa, em vez de desconfiar de tanta fartura, acreditou que aquele tesouro estava guardado para ela

Confrontada com a realidade, não desanimou, abraçou a sua sorte, pautando a sua vida pelo trabalho e dignidade. Tiveram duas Princesas. No primeiro Carnaval, de casada, desafiou o José, para se mascararem, e por um dia afastarem as tristezas e agruras da vida, comemorando o dia com fantasia e alegria, trocando as roupas: ela vestiu-se de homem e ele de mulher

Quando o patrão casou, o José teve de deixar de dormir no local de trabalho, porque, para além do quarto de casal, só havia outro, muito pequeno, para onde foi dormir o irmão dele

Valeu-lhe o sótão existente no cimo do prédio, onde já dormia o cunhado, da prima dele, que trabalhava numa oficina auto, para aprender a profissão de mecânico. Tinha uma janela para as traseiras, só se viam os telhados, o vão da janela era o único sítio onde se podiam pôr de pé. O espaço onde dormiam tinha um metro e pouco de altura

Era muito frio, no inverno, e muito quente no verão, porque as telhas estavam assentes nas travessas de madeira, sem qualquer isolamento

O patrão, do José, costumava, pelo Natal, oferecer garrafas do vinho do Porto, aos clientes. Num inverno de muito frio, aproveitaram as caixas de cartão para forrarem o sótão, tornando-o mais quente

 Mas, passados uns tempos, começaram a aparecer percevejos, tentaram matá-los com um pó, não deu resultado. Tiveram de arrancar todo o cartão e fazer uma desinfestação com creolina

O José, assim que soube fazer os tapetes, aproveitou os domingos para trabalhar, por cada tapete recebia quinze escudos. Num domingo de agosto, em que toda gente foi para a praia, conseguiu fazer quatro tapetes, foi como se tivesse ganho uma fortuna

O patrão alugou um andar, noutro prédio, para onde o casal foi dormir, uma vez que estava à espera da primeira bebé, ficando o local, onde faziam os tapetes, disponível para aumentar a produção, com mais horas de trabalho e mais pessoal

O irmão mais novo, do patrão, também deixou o Alentejo, para se juntar aos outros dois, fazendo com que a irmandade se tenha juntado, depois de anos em que cada um andou para seu lado

 Lisboa exercia uma grande atração, principalmente para os jovens da província, que não viam qualquer saída profissional, para o seu futuro, nas suas terras. O irmão e a irmã do José, assim que fizeram a quarta classe, também foram para Lisboa. Mais, tarde o irmão mais novo e a irmã mais nova, quinze e dezasseis anos mais novos, respetivamente, também foram, com os pais, para os arredores de Lisboa 

O irmão, da patroa, pediu a transferência das Finanças de Tondela, para o Ministério das Finanças. Passou, também, a ir fazer, nas horas vagas, tapetes para aumentar o rendimento mensal, e poder pagar a renda da casa, na Amadora, para onde tinha ido viver com a mulher

O José já lhe tinha dito que queria ir estudar, mas nunca mais se decidia, parecia não estar com muita vontade, nem muita pressa em voltar a não ter nenhum tempo de descanso, porque trabalhar

oitos horas por dia, com aulas das 20 às 24 horas, cinco dias por semana, não era muito agradável, nem tempo tinha para namorar

Mas, numa bela tarde, o cunhado do patrão, mal entrou na sala, e depois de os cumprimentar, voltou-se para o José e disse: “ andas a dizer que queres estudar, já sabes que não te livras da tropa, queres ir como soldado ou como sargento? Tens dois anos para fazeres o primeiro ciclo liceal, para ires como sargento”

Aquelas palavras mexeram tanto com ele, que ao fim do dia, quando acabou o trabalho, pegou na lista telefónica das páginas amarelas (o melhor motor de busca, daqueles tempos) e escolheu uma escola para ir estudar à noite. Na abertura do ano letivo, matriculou-se na Escola Académica, que admitia alunos internos e externos, no Largo Conde de Barão, perto de onde ele vivia, enquanto a anterior ficava na Praça da Figueira, e era para quem queria fazer a quarta classe

Como o dinheiro não era muito, aquando da apresentação dos professores, perguntou a alguns colegas onde iam comprar os livros. Informaram-no de que poderia comprá-los, no alfarrabista da Calçada do Carmo, que comprava e vendia livros usados

Na época de exames, inscreveu-se para fazer o primeiro ciclo liceal, no Liceu Passos Manuel, que fica perto de onde residia. Reprovou. Para além de serem dois anos num, já estava muito esquecido do que aprendera na instrução primária.

Continua

 

 

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