Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

cheia

cheia

29
Dez22

A sedutora

cheia

Lisboa! A sedutora

10

Tinha passado quatro anos com aquela família que, sempre o tratara bem, tinha um filho da sua idade. Mas que, infelizmente, a poliomielite incapacitara para o resto da vida, a irmã tinha menos dez anos

Brincaram muito, os três, no Jardim Botânico, nas tardes em que não havia movimento no estabelecimento

Uma família de Vide-Entre-Vinhas, Concelho de Celorico da Beira, Distrito da Guarda, muito crente

Nos primeiros dias a comunicação não foi fácil, um país tão pequeno, mas com muita diversidade

A pouco e pouca foram-no integrando nos seus rituais, começou por ir todos os domingos à missa, se não pudesse ir de manhã, à Igreja de São Mamede, ia à tarde à Igreja dos Mártires, ao Chiado, no mês de Maio, mês de Maria, iam todas as noites à Igreja, frequentaram a catequese juntos: ele e o filho dos patrões, e fizeram a primeira comunhão no mesmo dia, todas as noites, depois do jantar, rezavam o terço, por isto, por aquilo e, também, pela conversão da Rússia

Os carros e os eletrodomésticos trouxeram as vendas a prestações, uma novidade que não foi pacífica, uns continuavam avessos à nova modalidade de pagamento, defendendo que continuariam a pagar a pronto, outros dizendo que era uma boa oportunidade para beneficiar da utilização dos utensílios e ir pagando

O tempo encarregou-se de dizer o que viríamos a fazer. Infelizmente, são poucos os que conseguem dar-se ao luxo de comprar a pronto de pagamento

Hoje, compra-se tudo a prestações e a crédito, paga-se com cartões, e se não tivermos saldo, para pagar a totalidade dos cartões, o Banco agradece, ficamos a pagar juros, pelo saldo em dívida. Mas, como não querem que nos falte nada, criaram a conta ordenado, para comprarmos tudo o que quisermos, quando quisemos, sem termos de esperar pelo dia em que recebemos o ordenado

Temos é de ter cuidado, não podemos é ir além do orçamento, senão temos de recorrer à Deco para nos ajudar a fazer um plano de pagamento, para não termos de pedir a falência

O ideal seria nem tudo gastar e algum poupar, felizes dos que o conseguem fazer, ao fim do mês, chegar.

Continua

 

22
Dez22

A sedutora

cheia

Lisboa! A sedutora

9

Um bonito horário, bem emoldurado, na parede estava pendurado, onde se podia ler: horário de trabalho, entra às 9 horas, sai às 13, entra às 15 e sai às 19

Na realidade entrava às 5 horas, 5,30 ou 6, dependia da hora a que o patrão acordava e da quantidade de produtos que precisava de comprar na Praça da Ribeira e no mercado da fruta

Dormia na parte de trás do estabelecimento, num divã, num espaço, onde também funcionava a cozinha, tinha entrada pelo estabelecimento e pela serventia do prédio

Na adormecida madrugada, o patrão dava duas pancadas na porta, interrompia os sonhos, levantava-se ainda a dormir, vestia-se, lavava a cara e estava pronto para ir para a Ribeira

Às 7,30 apanhava o elétrico para ir abrir o estabelecimento às oito horas

A porta ondulada, de ferro, da largura do estabelecimento, era muito pesada para a sua pouca força, para que a conseguisse descolar do chão, tinha de agarrar nas duas pegas e inventar forças para a conseguir elevar à sua altura, depois era mais fácil empurrá-la até se enrolar toda

Pelas 9 horas, a patroa trazia-lhe o pequeno-almoço, tomava-o atrás do balcão, de pé, se entrasse algum cliente, atendia-o, depois continuava a saborear a sua primeira refeição do dia

O almoço também era servido no mesmo local, umas vezes de pé outras sentado nos cabazes vazios da fruta

Fechavam o estabelecimento às 21 horas, arrumava-o e lavava o chão, não havia esfregonas

Uma rotina de 365 dias por ano

Numa manhã, pelas 8,3horas entrou, no estabelecimento, um cliente diferente, perguntou pelo patrão, como ele não estava, disse que era fiscal do trabalho, passou uma multa de 200 escudos, e acrescentou que inscrevesse o empegado na Caixa de Previdência e tratasse do cartão de sanidade

O patrão não gostou nada da visita inesperada, disse que a multa era uma fortuna, mas cumpriu com tudo o que o fiscal determinou

O empregado é que não conseguiu atingir o ordenado de 200 escudos, entrou a ganhar 70 escudos, aumentou-o quando quis, nunca lhe pediu aumento, sempre 20 de cada vez, quando se despediu ganhava 190 escudos.

O patrão tinha-lhe prometido, várias vezes, que iria abrir um estabelecimento, para ele tomar conta

Não foi fácil dizer-lhe que se ia embora, que tinha arranjado um emprego de 8 horas de trabalho, que poderia, finalmente, estudar e fazer a vontade ao pai, que em todas as cartas lhe pedia que estudasse.

 

Continua

 

15
Dez22

A sedutora

cheia

Lisboa! A sedutora

8

Com a Revolução de 25 de Abril de 1974, o País abriu as fronteiras e teve de se adaptar à concorrência

Hoje, a etiqueta “ fabricado em Portugal” é reconhecida e apreciada por nacionais e estrangeiros

A Educação é o motor para o desenvolvimento da Nação. Mas, infelizmente, nem todos os Governantes têm sensibilidade e sabedoria para investirem e escolherem Ministros capazes de fazerem avançar o País, para não falar da escolha dos amigos, incompetentes

O Professor Veiga Simão, em 1970, foi nomeado Ministro da Educação Nacional, pelo Professor Marcelo Caetano

Defensor da democratização do Ensino, fez uma das mais importantes reformas, que ainda hoje dá frutos

Foi responsável pela criação das Universidades Nova de Lisboa, do Minho e de Aveiro, e do  Instituto Universitário de Évora

Uma das medidas que mais beneficiou os mais desfavorecidos, estudantes trabalhadores, foi a possibilidade de se fazer o segundo ciclo liceal, por disciplina, em vez da obrigação de o fazer por secção (secção de letras ou de ciências) a partir dos dezoito anos, candidatando-se a exame, como alunos externos

O Ensino Liceal constava de três ciclos. Para o primeiro ciclo liceal, o primeiro e segundo anos, terceiro, quarto e quinto, anos para o segundo ciclo, sexto e sétimo, anos para o terceiro ciclo

Fazer os três anos por disciplinas, em vez de ter de fazer todas as disciplinas em simultâneo, fez com que muitos rapazes conseguissem completar o Ensino Liceal, dando-lhes acessos à classe de Oficiais, ingressando no curso de Oficiais Milicianos, para cumprirem o serviço militar obrigatório

Diz-se que esta alteração, no ensino secundário, fez com que os filhos dos pobres, também, tenham contribuído para o Movimento das Forças Armadas, que derrubou a ditadura, na madrugada do 25 de abril de 1974

Por volta dos meados da década de sessenta, o Exército passou a exigir o segundo ciclo liceal, para a frequência do curso de Sargentos Milicianos, porque já tinham candidatos suficientes com o segundo ciclo liceal

Por toda a Lisboa havia Colégios e Centros de Ensino de Línguas, e os alunos das Universidades davam explicações aos do Ensino Liceal

Fosse porque a guerra despertou, nos rapazes, a vontade de cumprirem o serviço militar como oficiais ou sargentos, em vez de praças, fosse porque a vida de caixeiro era muito dura, todo o dia de pé, com horários de trabalho de oito horas, só para inglês ver, porque esses horários não eram cumpridos

Na década de sessenta, os Colégios, os Centros de Línguas e as explicadoras e explicadores tiveram uma grande procura

A ambição era saltar do balcão para o escritório. Mas, para isso, era preciso ter o segundo ciclo liceal.

Continua

 

 

 

08
Dez22

A sedutora

cheia

 Lisboa! A sedutora

7

No ano de 1959, pelo menos, duas grandes inaugurações: a 17/5/1959 foi inaugurado o Santuário Nacional de Cristo Rei

Um mar de gente invadiu as ruas da baixa de Lisboa em direção aos cacilheiros, os barcos que fazem a travessia do Tejo entre Lisboa e Cacilhas, 300 mil pessoas assistiram à inauguração

Quase no fim do ano, em 29/12/1959 foi inaugurado o Metropolitano de Lisboa. Alguns dos passageiros, quando voltaram à superfície, disseram que tiveram dificuldades em respirar

Tudo o que é novidade pode causar alguma ansiedade. Todos sabemos o que aconteceu com alguns produtos alimentares, em que o Rei teve de os comer em público, para que o povo acreditasse que não fazia mal à saúde, o que aconteceu com as batatas

As mudanças e as novidades eram constantes, do estrangeiro copiámos o snack-bar e o self-service. O primeiro self-service, em Lisboa, se não estou em erro, funcionou na Avenida Liberdade

Havia uma fila enorme, todos queriam saber como funcionava a novidade, pegar num tabuleiro, recheá-lo e colocá-lo num apoio alto, comer de pé, para ser mais rápido

Muitos olhos a vararem-nos como se nos quisessem fuzilar, parecendo dizer para nos despacharmos, porque também queriam petiscar

Para quem tinha duas horas para o almoço, aquilo era inconcebível, o melhor era continuar a ir ao tradicional restaurante, comer e beber, ficar ali no ripanço, a falar de futebol, a concordar ou discordar do trabalho do árbitro

As tabernas, só frequentadas por homens, trabalhadores braçais, onde bebiam vinho ao copo, tirado dos barris, de fraca qualidade, muito feito a martelo, acabaram por desaparecer, também vendiam carvão e petróleo

Os cafés, no início eram mais para as elites, onde discutiam política e forjavam revoluções

Nos anos sessenta não se viam mulheres nos cafés, onde se podia passar o dia a estudar ou dar explicações

Muitos eram espaços enormes, com muitos lugares, em quanto que o snack-bar, normalmente era um pequeno espaço, com refeições leves e rápidas

Vieram fazer concorrência aos restaurantes, onde se passavam duas horas ou mais a almoçar

Quando os snack-bares apareceram, os alfacinhas sentiam-se importantes, quando diziam: “ vou ao snack-bar”, era como se aquela palavra lhes desse outro valor: os tornasse importantes, diferentes dos que não frequentavam aquele espaço, para eles, snobe 

Durante muitos anos, preferimos produtos estrangeiros, tínhamos uma grande admiração por tudo o que vinha de fora. Poderá estar relacionado com a fraca qualidade dos nossos produtos, por não haver concorrência, e tudo o que produzíamos ter escoamento nas colónias.

 

Continua    

 

01
Dez22

A sedutora

cheia

Lisboa! A sedutora

6

A guerra, primeiro em Angola, depois na Guiné e em Moçambique, veio ajudar a transformar o País

Com, cada vez, mais homens mobilizados para as frentes de combate, as mulheres tiveram de ocupar os postos de trabalho, que os homens já não podiam assegurar

Foram mobilizados homens, que já tinha cumprido a vida militar há 10 anos ou mais, como oficiais milicianos, que tinham as suas vidas organizadas, obrigaram-nos a deixar o emprego, as mulheres e os filhos, graduaram-nos em capitães, comandavam uma companhia, e eram eles que com sargentos e praças iam para o mato

As Escolas Práticas e outros centros de formação de oficiais milicianos não conseguiam mobilizar os jovens suficientes para oficiais, porque eram poucos os que tinham, pelo menos o sétimo ano do liceu, para poderem ir para o curso de oficias milicianos

Em 1968, nas Caldas da Rainha, nos cursos de instruendos para sargentos, finda a recruta, os oficiais pediam para os elementos de cada pelotão, por voto secreto, escolhessem três camaradas para irem para o curso de oficiais milicianos, a escassez obrigou à criação da exceção

Não eram só os militares que tinham dificuldades em recrutar homens com estudos.

Também as empresas não conseguiam encontrar trabalhadores qualificados, para os seus quadros, algumas davam formação, pós laboral aos seus trabalhadores e pagavam-lhes aulas em institutos e escolas de línguas, para aperfeiçoarem, principalmente, o inglês

Algumas empresas, de representações de produtos estrangeiros, tinham dificuldade em satisfazer os pedidos dos seus representados, para que se deslocassem às suas fábricas, técnicos para formação, no sentido de prestarem melhor assistência, pós venda, por não saberem inglês  

A forte emigração, nos anos 60 e 70, também contribuiu para um grande desenvolvimento com o envio das suas poupanças para o nosso País. Todos tinham a ambição de mandarem construir vivendas, nas suas terras natal

A construção civil teve um grande incremento, bem como os Bancos, que com as remessas

dos emigrantes, tiveram de admitir muitos trabalhadores, quase só homens, mas a pouco-e-pouco as mulheres foram chamadas para mais setores de atividade

A nacionalização dos Bancos, devido ao golpe militar do 11 de Março de 1975, contribuiu para que as bancárias e bancários, que vieram das antigas colónias, tenham sido integrados nos bancos nacionais

A descolonização não foi perfeita, mas foi a possível, poderia ter sido diferente, se tivesse acontecido antes dos movimentos de libertação terem iniciado a guerra

Todos os que abandonaram as antigas colónias e vieram para Portugal, apesar de terem passado por muitas dificuldades, foram integrados e contribuíram para a dinamização do País

Somos um País pequeno e pobre, mas um povo grande e acolhedor.

Continua

 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Pesquisar

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2011
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2010
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2009
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2008
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2007
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D

Em destaque no SAPO Blogs
pub