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cheia

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24
Nov22

A sedutora

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Lisboa! A sedutora

5

As grandes novidades tecnológicas dos anos 50 e 60 e a guerra fizeram com que o país fosse mudando

Em 1957, com o aparecimento da televisão e o início das transmissões regulares da RTP, tudo mudou, a caixa mágica, que até hoje, nunca mais nos abandonou

Mas poucos tinham dinheiro para terem uma televisão, para além do preço do aparelho, havia que contar com um escudo, por dia, para pagar a taxa da televisão

Só as famílias abastadas tiveram acesso às primeiras transmissões regulares de televisão

Alguns estabelecimentos viram nessa novidade uma oportunidade para angariarem mais clientela, principalmente os cafés e os restaurantes

Vi a apresentação das apostas mútuas desportivas totobola, explicadas pelo saudoso Artur Agostinho, pela televisão, num café, na rua de São Marçal, em Lisboa, onde ia, de quando-em-vez, com o meu patrão, nunca ficávamos até ao fim da emissão, porque no outro dia tínhamos de nos levantar muito cedo, pelas 5 ou 6 horas

Enquanto nós íamos para o café, a patroa ia deitar o filho e a filha, como habitualmente, as mulheres com menos oportunidades de lazer, devido à maternidade

O primeiro concurso do totobola teve lugar a 24 de setembro de 1961

Outro objeto que fez muito sucesso foi a esferográfica, que até hoje continua nossa companheira

Quando foi publicado, no Diário do Governo, que se podiam assinar cheques e escrituras com uma esferográfica, um advogado entrou no estabelecimento, com o Diário do Governo debaixo do braço e uma esferográfica na mão, eufórico, perguntou: “sabem que já se podem assinar cheques e escrituras com uma esferográfica?”

A caneta de tinta permanente acabava de perder o seu reinado, a esferográfica iria tirar-lhe o protagonismo, fazendo com que fosse votada ao esquecimento

Uma revolução comparável à que estamos a viver, uma vez que já podemos assinar escrituras e o divórcio, no aconchego das nossas casas.

Continua

 

 

17
Nov22

A sedutora

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Lisboa! A Sedutora!

 

4

Lisboa tinha dificuldade em acolher tanta gente, o que fazia com que a habitação fosse um dos maiores problemas dos pobres, tal como hoje

Nas casas grandes, com vários quartos, chegavam a viver três casais, os donos da casa e mais dois casais e filhos, caso já fossem pais, só com uma casa de banho

Outra situação era viver em parte de casa, em que dois casais alugavam uma casa, pareceu-me uma solução de mais difícil convivência

As águas furtadas também eram utilizadas, para dormir, porque só se conseguia estar de pé junto da janela

Como as rendas estavam congeladas, alguns senhorios recusavam-se a receber as rendas, nesses casos os inquilinos podiam abrir uma conta na Caixa Geral de Depósitos, em nome do senhorio, e depositar todos os meses o valor da renda, até ao dia 8, o que fazia com que o senhorio não pudesse pôr fora o inquilino

O dia 8 era sagrado, quem não quisesse ficar sem casa tinha de arranjar o dinheiro, nem que tivesse de recorrer (ao prego) à casa de penhores, onde o objeto penhorado, normalmente, ficava no prego, à espera que a dono ou dona o resgatasse, dentro do prazo, caso contrário o artigo ficava para a casa de penhores

Aquando da anexação, pela União Indina, do Estado Português da Índia, foram organizadas procissões, em Lisboa, para pedirem a intervenção do grande almirante Afonso de Albuquerque

Uma das procissões teve início junto à Igreja de São Mamede, em direção ao Convento do Carmo, escoltada pelas viaturas da Legião Portuguesa, chegada ao destino, a multidão gritou: “ levanta-te grande Almirante, porque a Nação está em perigo”

No comércio era tudo vendido avulso, ainda não se tinha generalizado a utilização do plástico

O leiteiro, que andava de porta em porta, numa das mãos trazia a bilha do leite, na outra as medidas

Nas mercearias, os clientes raramente compravam quilos e litros de feijão, arroz, farinha, azeite

Pediam cem gramas, duzentos gramas, quinhentos gramas,1 decilitro, 3 decilitros, meio litro

Os produtos, exceto o azeite, estavam armazenados em sacos, onde, por vezes, os ratos se passeavam.

Continua

14
Nov22

As ruas

cheia

A minha rua

 

Em cada rua, cada casa tem dentro corações atentos

Na palpitação de quererem aproveitar os melhores momentos

Cada qual nutre-se dos melhores e encantadores sustentos

 Lá fora ninguém sabe o que se passa nos apartamentos

Nem todos os dias são longos, com discussões e cinzentos

Há dias em que brilha o vento, há beijos e abraços, há movimentos

Se as paredes falassem, poderiam contar como são celebrados esses eventos

A ternura, a delicadeza, a beleza para eternizar, do coração, todos os batimentos

As mãos entrelaçadas nos beijos das bocas queimadas pelos pensamentos

Os corpos diluídos, no calor de um grito contido, na explosão de todos os ventos

Não há tempo para rodopiar por todos os cantos e assentos

O amor é tão forte que consegue sobreviver até nos conventos

Por muito que o queiram pender, ninguém consegue conter os seus empolgamentos

A minha rua é dona da lua, nas noites quentes, frias e nos dias sonolentos

Cada um tem uma rua, a que chama sua, mesmo em dias de aborrecimentos

Enquanto a rua dorme não há beijos, nem abraços, nem cumprimentos

É como se todos tivessem assinado um acordo de paz e bons entendimentos

Para que a madrugada acorde alegre, contente, eufórica, para novos envolvimentos.

 

José Silva Costa

 

 

 

 

10
Nov22

A sedutora

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Lisboa! A sedutora

3

As cidades são como as pessoas, vão envelhecendo, mas ao contrário das cidades, que raramente perdem o brilho, as pessoas não o conseguem conservar

Lisboa está tão diferente do que era antigamente, há menos de um século, está irreconhecível!

Era uma cidade triste, sem cor, onde não havia liberdade, havia medo de falar, não podíamos a nossa opinião revelar, não se sabia quem nos estava a espiar, uma cidade só para nacionais, transformou-se numa cidade universal, vestiu-se de novas cores, desabrochou, tornou-se numa bonita flor

No final dos anos cinquenta ainda havia algumas carroças pela cidade que, a pouco-e-pouco, foram totalmente substituídas pelos carros: a praga que não para de crescer, sufocando as cidades e as estradas, tornado o ar irrespirável, como aconteceu na avenida da Liberdade, em Lisboa

Não podemos passar sem eles, transformaram-se numa ferramenta de trabalho, tal como o computador e o telemóvel

A esperança está na nossa capacidade de inovação, fazendo-nos acreditar que em breve acabaremos com os motores de combustão. Mas não tenhamos ilusão, os desafios continuarão

Em 1958, ainda, havia uma olaria ao cimo da rua da Imprensa Nacional, mas o plástico viria para ficar e tornar-se numa das maiores invenções, e a olaria foi substituída por uma loja de plásticos

Nesse ano, o General Humberto Delgado, sem saber proferiria a sua sentença de morte, ao responder à pergunta dos jornalistas, o que faria a Salazar, se ganhasse as eleições presidências, que se supõe ganhou, cuja resposta foi: “obviamente, demito-o”

Mais tarde, disse que o regime só cairia com um golpe militar, o que veio a acontecer em 25 de Abril de 1974

Daí em diante tudo se precipitou, graves acontecimentos marcaram o País: a 25/01/1961 foi assaltado o paquete Santa Maria, a 4/02/1961, teve início a guerra em Angola, em dezembro do mesmo ano a União Indiana anexou o Estado Português da Índia: Goa, Damão e Diu, a 28/05/1963, no trigésimo sétimo aniversário da revolução de 1926, que deu origem ao Estado Novo, coincidência ou sabotagem, a cobertura das plataformas da estação ferroviária do Cais do Sodré, em Lisboa, abateu, causando 49 mortos e 69 feridos, a 13/02/1963 foi assassinado, pela PIDE, em Badajoz, o General Humberto Delgado, a 17/05/1967 foi assaltado o Banco de Portugal, na Figueira da Foz

Lisboa, também, atraiu alguns Galegos, que procuraram, na nossa capital, uma vida melhor Eram donos de restaurantes, num deles tive oportunidade de ver que tinha um osso de vaca, preso ao teto, que descia para a panela da sopa, quando ela estava a ferver, para dar gosto, depois voltava a subir para perto do teto, não sei quantas vezes deu gosto à sopa

Também se destacaram como moços de fretes. Havia muitas mudanças, principalmente, as mulheres gostavam muito de mudar de casa, para transportar as mobílias, que eram muito pesadas, e os pianos, recorriam aos moços de fretes, em grande parte, Galegos

O que deu origem a que, quando alguém pedia a outro para carregar um peso considerado demasiado, o outro perguntasse: “sou algum Galego?”

 Um serviço leve e muito bem pago, para o qual, também, eram muito solicitados, era a entrega de cartas em mão, com a recomendação de que só as entregassem aos destinatários. (“cartas de amor, quem as não tem?”)    

 

Continua

 

 

 

03
Nov22

A sedutora

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Lisboa! A sedutora

(2)

Lisboa fervilhava de criados e criadas, enquanto as províncias iam ficando sem jovens, que já não se sujeitavam aos trabalhos do campo, onde labutavam os pais e os avós

Na grande cidade poucas mulheres trabalhavam, só as mais pobres, as outras, competia ao marido assegurar o rendimento, para o sustendo da casa, incluindo o contrato de criada ou criadas

Nos bairros chiques, as casas tinham porteira, e nas traseiras, as escadas em ferro (as escadas de serviço) por onde leiteiros, carvoeiros, padeiros, merceeiros ……….. transportavam, diariamente, os bens de primeira necessidade de que as  famílias precisavam

Às porteiras competia a limpeza da entrada e escada interior, algumas tinham as chaves de todos os condomínios para que, caso os condóminos se esquecessem das suas, elas lhe abrissem a porta da casa

Na rua da Imprensa Nacional, uma porteira tinha muito brio em que a escada estivesse, sempre, a brilhar: ela lavava-a e dava-lhe cera, o marido puxava o brilho, viviam felizes por único filho andar no sétimo ano do Liceu, prestes a entrar para a Universidade, o que não era habitual, os filhos dos pobres chegarem ao ensino superior

Como sempre, há bons e maus patrões: os que respeitavam os rapazes e as raparigas, tratados com dignidade, como dizia o contrato verbal, mesa, cama e roupa lavada

Mas também havia quem lhes batesse, quem abusasse das raparigas, comer e cama indignos

Criadas e criados estavam numa situação muito fragilizada, sem familiares por perto, entregues à sua sorte, na grande cidade, dependentes da mesa e da cama, quase impossibilitados de dizerem não, sem horário de trabalho, nem feriados, nem férias

Nos estabelecimentos estavam afixados os horários de trabalho, mas era só para inglês ver

De anos a anos apareciam os fiscais do trabalho, para verificarem o horário de trabalho, se os empregados estavam inscritos na Caixa de Previdência, e no caso dos que trabalhavam com produtos alimentares era obrigatório ter cartão de sanidade

Para além dos criados e criadas, existiam os vendedores ou compradores com os seus pregões

A mulher da fava-rica:“ fava-rica, dos figos: “quem quer figos, quem quer almoçar”, a varina: “sardinha vivinha, da costa”, o homem do ferro velho: “quem tem trapos, jornais ou garrafas para vender”, e sem pregões, as lavadeiras de Caneças, que todas as semanas entregavam a roupa lavada e levavam a suja, e os vendedores de água de Caneças, em bilhas de barro

Não faltavam os peditórios para os Bombeiros Voluntários, para os Invisuais e para os Inválidos do Comércio: colocavam um carro em cima de uma camioneta, sem tapais, e vários homens abordavam os transeuntes e os lojistas, para lhes venderem as rifas, para o sorteio do carro

Nos anos 60 ter um carro era o sonho de muita gente, que só o conseguiria num sorteio ou na participação de um concurso

Somos muito solidários, mas com engodo, ainda, muito mais!

Continua

 

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